terça-feira, 5 de junho de 2012

Fichamento - Redes sociais digitais: a cognição conectiva do Twitter

SANTAELLA, Lucia; LEMOS, Renata. A cognição conectiva do Twitter. São Paulo: Paullus, 2010. Capítulos  5, 6 e 7.

Por Lisianne Barberino e Roberto Martins


Sobre as autoras:

LUCIA SANTAELLA
Professora titular na pós-graduação em Comunicação e Semiótica e coordenadora da pós-graduação em Tecnologias da Inteligência e Design Digital (Puc-SP). Doutora em teoria literária pela Puc-SP e livre-docente em ciências da comunicação pela Usp; é presidente honorária da Federação Latino-Americana de Semiótica, diretora do Centro de Investigação em Mídias Digitais (Cimid) da Puc-SP, membro correspondente da Academia Argentina de Belas-Artes e presidente da Charles S. Peirce Society, Estados Unidos, em 2007. Entre suas publicações estão: Culturas e Artes do Pós-Humano – Da Cultura das Mídias à Cibercultura; Corpo e Comunicação – Sintoma da Cultura; Linguagens Líquidas na Era da Mobilidade; Navegar no Ciberespaço, Conectividade, Mobilidade, Ubiquidade, entre outros.

RENATA LEMOS
Especialista em cultura digital. Pesquisadora e aluna do Programa de Doutorado em Comunicação e Semiótica da Puc-SP, com bolsa sanduíche pela Capes na EGS, Suíça. É membro do coletivo de pesquisa internacional Space Collective e associada a diversos think tanks no Brasil, Europa e Índia. Sua formação é transdisciplinar, integrando arte, ciência e tecnologia.

Objetivos dos capítulos
O foco de atenção deste fichamento recai sobre os capítulos que centram suas analises nas especificidades do Twitter. No capitulo 5, “Inflow vs. Outflow: Twitter & Microdesign de ideias”, além da abordagem introdutória sobre o assunto, incluindo uma tentativa de definir o que é o Twitter, seu funcionamento e especificidades, o leitor encontrará uma investigação acerca do surgimento de novos tipos de colaboração intelectual em rede e o desenvolvimento de novas habilidades cognitivas propiciado e incentivado por estas redes. Já no capitulo 6, ”Visualizando Laços Sociais no Twitter: O continuum na era dos fluxos”, as autoras ilustram as formas de representar os fluxos informacionais e como mapea-los. Por fim, o capitulo 7, ”QOTD, por @Umairh: Micromídias Móveis e Inteligência Coletiva Global em Tempo Real” analisa o uso do Twitter, como um espaço de dinâmicas sociais de inteligência coletiva e de articulação de design colaborativo em tempo real. A referencia principal do capitulo é a dinâmica Qotd.

Argumentação Central:
A argumentação central dos capítulos aqui apresentados é a de que o Twitter é uma Rede Social particular. Ele possui características únicas e diferenciais em relação às outras plataformas. De acordo com Santaella e Lemos, por suas especificidades, o Twitter é ilustrativo das inúmeras mudanças provocadas pelas redes sociais de internet e na maneira do ser humanose relacionar. Esta plataforma possibilita o surgimento de novos tipos de colaboração intelectual em rede. Tal colaboração caracteriza uma nova etapa de evolução nos processos de inteligência coletiva e nas habilidades cognitivas mediadas por computador.

INFLOW VS. OUTFLOW: TWITTER & MICRODESIGN DE IDEIAS.

Tópico 1: O que é o Twitter:
As autoras defendem a tese de que o Twitter é uma mídia social particular que apresenta características únicas em relação a outras plataformas de rede social de internet, tais como o Facebook e Orkut. O Twitter é entendido como um misto de rede social e microblogging, que unindo a mobilidade do acesso e a temporalidade do always on, possibilita o entrelaçamento de fluxos informacionais e o design colaborativo de ideias em tempo real, assim como levanta a necessidade de ações simultâneas de inteligência coletiva.

Tópico 2 - Inteligência estratégica na inserção e sociabilidade de rede: Por ser o Twitter uma mídia social de interação complexa, o processo de inserção de um usuário não é imediato. Este requer uma habilidade estratégica e um planejamento anterior (sobretudo para marcas e profissionais), baseado nas características específicas desta plataforma.  As autoras trazem um dado de que 60% dos novos usuários abandonam o Twitter depois do primeiro mês de uso (Martim, 2009). Estas taxas são bem superiores às registradas em outras redes sociais, como Facebook e o Orkut. Isto pode ser entendido, em parte, pelo Twitter não ser voltado às redes de contatos pessoais pré-existentes na vida offline, mas sim, proporcionar a convergência, em um mesmo fluxo, de múltiplos fluxos informacionais. Segundo as autoras, o sucesso da inserção nesta rede depende muito da qualidade do conteúdo veiculado pelo usuário. As exceções neste caso seriam as celebridades e os experts com público cativo.

Tópico 3 – Fluxos Informacionais: Inflow e Seleção de Fluxos. No Twitter, o conteúdo informacional do fluxo interno (inflow) de um usuário é proveniente de suas escolhas de alimentação. Quando seguimos alguém estamos fazendo uma "assinatura" do seu canal de informação para o nosso fluxo pessoal, processo que as autoras nomearam como: design personalizado do inflow.  Como cada pessoa seleciona seu fluxo pessoal, baseado em preferências e objetivos particulares, este será único e personalizado. O design interno (inflow) depende de uma lenta avaliação e triagem dos perfis disponíveis no Twitter. Sua configuração é processual e mutável, sendo este influenciado pelo tipo de experiência midiática desejada pelo usuário. Existe um enorme número de combinações possíveis de fluxo inflow no Twitter, o que podem gerar os mais variados tipos de entrelaçamentos informacionais. 

Tópico 3.1: Fluxos Informacionais: Outflow e Microdesign de Ideias.  Se no Twitter a noção de inflow, diz respeito à escolha de acesso de um conjunto de canais emissores (recepção de conteúdo); a de outflow refere-se à distribuição de informações por parte do usuário (produção de conteúdo). O tipo de conteúdo veiculado pelo usuário através do Twitter irá depender de sua estratégia pessoal de mídia, o que pode ser bastante variado.  Ao compor sua estratégia de outflow no Twitter , o usuário(até mesmo marcas e empresas) precisa ter em mente que está em ambiente relacional, portanto este conteúdo deve ter um caráter pessoal e emocional; o que evidencia o caráter conversacional da plataforma. O outflow não é um canal estático e unidirecional, cada novo tweet penetra em um fluxo vivo, em continuo movimento, que se renova em tempo real. O outflow é interdependente – mistura elementos autorais, pessoais, indicações, links, e elementos de edições em tempo real. De acordo com esta abordagem, cada usuário do Twitter se transforma em um designer artesanal de ideias – ou seja, este é o único responsável pela escolha de ideias e pensamentos que farão parte de seu fluxo de outflow. O design de ideias dentro do Twitter é um processo que entrelaça contribuições individuais a outras, coletivas.  Nesse caso, em que a inteligência se expressa através do design colaborativo de ideias, surge uma inteligência coletiva que se baseia não apenas no uso e acesso aberto ao conhecimento disponibilizado coletivamente, mas sim, em esquemas conceituais que começam a ser acessíveis apenas ao visualizarmos o todo dessas microcolaborações (tweets autorais, RTs, menções, links, pointers, hashtags, etc.)

Tópico 4: Inteligência Cognitiva no Gerenciamento de Atenção. A inserção aprofundada no Twittter requer um tipo de presença digital continua do usuário, que necessita adquirir, de acordo Rheingold (2009), um novo tipo de habilidade cognitiva de atenção denominada de attencion literacy ou infotention (infoatenção).  As autoras citam novamente Rheingold, para afimar que o gerenciamento de atenção bem sucedido dos fluxos informacionais no período atual da internet requer habilidades cognitivas hibridas que conectam inteligências humanas e artificiais.  Segundo o autor, as habilidades cognitivas que ajudam a gerenciar a complexidade dos fluxos informacionais são quatro: participação, colaboração, filtragem, e presença consciente em rede. Esse conjunto de habilidades cognitivas é denominada por  Rheingold de mindful infotention (presença mental continuamente alerta). Neste tópico, as autoras questionam como manter, com o caráter always on, com a ubiquidade do Twitter e com a quantidade de fluxos informacionais, uma presença mental alerta, sem prejudicar a qualidade de vida do "lado de cá" das redes; e como manter o ritmo de trabalho e a concentração mental sem ser tragado por estes fluxos de infodistração.


VISUALIZANDO LAÇOS SOCIAIS NO TWITTER: O CONTINUUM NA ERA DOS FLUXOS.

Tópico 1: Visualizando Laços Sociais no Twitter: As autoras consideram não há um consenso sobre a verdadeira dimensão do impacto social do Twitter e que ainda se vive (na época da escrita do texto) o momento de expansão global da plataforma. Elas abordam o pensamento de Nussbaum (2009) para quem o Twitter é percussor de um modelo interativo inédito que mistura “auto-publicação e rede social”. Destacam a mudança dos tempos de ênfase na interatividade humano e máquina, para a experiência direta de sociabilidade em rede mediada por computador.  Para as autoras o Twitter diferencia-se de outras redes sociais, por seus laços sociais não serem baseados em vínculos pré-existentes, mas sim em fluxos coletivos.

Tópico 2: Visualizando a sociabilidade em rede: Como representar fluxos?  Neste tópico é abordado o choque existente na passagem da era da “navegação” para a era dos “fluxos”. Na era dos fluxos não há separação entre mundo virtual e o real, como nos anos 1990. Segundo as autoras, isto implica numa reestruturação da arquitetura informacional da internet em função dos laços sociais. Quanto mais especifico for um nicho particular de comunidade, mais embutidos serão estes laços sociais. No entanto, em um ambiente como o Twitter, onde existem comunidades mistas de emissores, receptores e emissores-receptores de informação, a visualização é extremamente complexa.

Tópico 3: Aplicativos de visualização: Mapeando Tramas de conexão social. Neste tópico são mencionados aplicativos para mapeamento dos laços sociais no ambiente digital. É abordada a teoria moderna dos “seis graus de separação”, as quais prepararam o caminho para o desenvolvimento de vários programas como o Vizster, com diferentes focos de visualização dos fluxos no Twitter. As autoras se debruçam sobre três destes aplicativos de visualização de laços: O Foller, o MentionMap e o Twitnest. O primeiro fornece informações restritas a um grupo de seguidores. O segundo é um aplicativo que permite uma visualização baseada em conversações e interação entre usuários. E o terceiro, mapeia relações entre os membros de uma mesma rede.

QOTD, POR @UMAIRH: MICROMÍDIAS MÓVIES & INTILGÊNCIA COLETIVA GLOBAL EM TEMPO REAL

Tópico 1:  Evolução das funcionalidades & aplicativos do twitter. De acordo com a pesquisa de Santaella e Lemos, entre todas as outras plataformas sociais de uso generalizado, como Orkut e Facebook, o Twitter é aquela que permite a multiplicação mais acelerada de modos de conexão vinculados a temáticas especificas. Para elas, ao contrário das redes sociais baseadas em perfis individuais com acesso restrito, o Twitter é uma rede social de acesso completamente aberto, no qual a grande maioria dos usuários é disponível a toda rede, permitindo a livre apropriação e redirecionamento dos tweets. Tal interação é baseada na combinação de três funcionalidades: Retweets (serve para mencionar um conteúdo proveniente de outro autor); : #Hashtags (indexadores de temas, acesso a fluxos coletivos); : Search: @usuário (ferramenta de bsuca que permite acessar todas as mensagens que inluam o nome de determinado usuário e acompanhar um fluxo pessoal).

Tópico 2: Tweet: micromídia pluridirecional & multiespacial As três funcionalidades mencionadas no tópico anterior, inerentes à arquitetura informacional do Twitter, em muitos casos, podem suceder-se simultaneamente. Assim, um único tweet tem penetração simultânea em fluxos individuais e/ou coletivos em tempo real. Isto caracteriza a interatividade pluridirecionada desse micromídia móvel e permite a multiplicação exponencial dos laços sociais em rede, atuando de forma similar a uma rede de conexões neurais.

Tópico 3: Aplicativos para mobilidade . A expansão das funcionalidades do Twitter é uma de suas características essenciais. Existem vários aplicativos (chamados apps) que acoplados a esta plataforma facultam a visualização múltipla de fluxos, a participação sincrônica e formas personalizadas de interação em rede. Santaella e Lemos citam Solis (2009) para lembrar que em 2007 havia apenas um Twitter app e dois anos depois eles já chegavam a 50 mil. São exemplificados, entre outros, o Twitpic (app para fotografia), o Foursquare (app de rastreamento espacial) e Posterous (para postagens automáticas de documentos, textos e vídeos).

Tópico 4: Microssintaxe. A característica do Twitter de micromídia, com sua limitação de espaço textual de tweet em 140 caracteres possibilitou um sistema de microssintaxe especifico. Além das três funcionalidades já mencionadas, outras foram acrescentadas, como as chamadas slashtags: /via , /by e /cc. Isso torna evidente que um novo tipo de interação emerge em resposta às características das micromídias e o seu uso efetivo se torna um requisito fundamental para inserção de um usuário neste ambiente.

Tópico 5: A ecologia sociocultural do Twitter . As autoras apresentam o argumento de Rheingold (2009) e Miemis (2009) de que, embora o Twitter seja considerado uma única comunidade virtual, ele é bem mais entendido como uma ecologia de comunidades integradas em um ecossistema flexível, no qual comunidades são formadas ou dissolvidas à medida que o interesse por um tema específico aumenta ou diminui. No Twitter, quanto maior for o leque de interesses de um usuário maior será a gama de usuários aos quais ele irá se relacionar. Isso faz com que a ecologia cultural de hábitos interativos desta plataforma seja extremamente diversificada e esteja em constante adaptação.

Tópico 6: Design colaborativo via Twitter: Arte, inteligência coletiva & entrelaçamento social. O Twitter tem servido para diversas comunidades experimentarem novas formas de interação. Através das #hashtags muitos conteúdos tem servido como apêndice das mídias massivas. Também surgem nichos de comunidades acadêmicas, artísticas e/ou profissionais, onde surgem demonstração de inteligência coletiva e design colaborativo do Twitter. As autoras citam quatro exemplos de interação colaborativa: 1 - #FF (Follow Friday) - surge as sextas feiras e os usuários sugerem pessoas a serem seguidas; 2 - #draw365 – comunidade de artistas para postar seu desenhos diariamente; 3 - #journchat – encontro virtual com hora marcada e temática especifica; e 4 - #MonTwit – metadiscussão sobre o Twitter dentro do Twitter.

Tópico 7: QOTD, por @umairh. A hashtag #qotd  tem sido usada no Twitter, de forma geral, para se referir a já clássica “Quote Of The Day”, mas possui outro significado na programação computacional. Qotd é um protocolo padrão que objetiva levantas informações e medidas sobre um dado ambiente digital. O experimento qotd em inteligência coletiva através do Twitter foi articulado por Umair Haque. O autor tem efetuado uma revisão dos princípios operacionais do capitalismo no século XXI, através de ideias como “valor magro” vs. “valor denso”, com críticas a economia moderna, a qual ele se refere como “economia zumbi”. Umair criou a palavra “midiaconomia” (mediaconomy) para se referir a tensão entre os modelos de geração de renda utilizados pela estrutura comercial fechada da mídia de massa vs a estrutura aberta e livre da mídia digital.

Tópico 8: Implicações práticas e teóricas do QOTD  O qotd enquanto instância representativa de um novo tipo de interatividade em rede, na qual o entrelaçamento social dá origem a outros entrelaçamentos – globais, conceituais, culturais e políticos -, aponta para as seguintes tendências: 1 - a constatação de certo descaso das mídias de massa em relação a determinados aspectos da pauta temática, torna a obtenção de informações via rede, ainda mais importante; 2 - a interação social em rede proporciona seleção instantânea de lideranças intelectuais; e 3 – o design colaborativo de estratégias coletivas de interação social em rede com vistas na produção de um resultado específico. Diante destas noções, para as autoras, uma nova dinâmica de validação e reputação e está surgindo dentro do Twitter. E esta plataforma tem sido usada como um vértice intercultural, na qual expressões verdadeiramente transculturais começam a surgir como manifestações espontâneas de interação social.  

Tópico de Conclusão: A presente pesquisa é uma tentativa de olhar de frente para algumas questões centrais que as redes sociais trouxeram a tona nos últimos anos.  Entre as conclusões apontadas pelas autoras, está o fato de que a utilização bem sucedida do Twitter exige não apenas a fluência em relação aos seus códigos de uso, mas principalmente o desenvolvimento de uma estratégia consciente de quais são os objetivos e resultados que se pretende alcançar com tal rede. Outra importante constatação da pesquisa foi identificar a interdependência entre os upgrades da estrutura de suporte tecnológico e as novas estratégias de sociabilidade em rede. Alguns potenciais do Twitter também foram apontados, tais como o ciberpolítico e o senso de cidadania global compartilhado.

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