SANTAELLA, Lucia; LEMOS, Renata. A cognição
conectiva do Twitter. São Paulo: Paullus, 2010. Capítulos 5, 6 e 7.
Por Lisianne Barberino e Roberto Martins
Sobre as autoras:
LUCIA SANTAELLA
Professora titular na
pós-graduação em Comunicação e Semiótica e coordenadora da pós-graduação em
Tecnologias da Inteligência e Design Digital (Puc-SP). Doutora em teoria
literária pela Puc-SP e livre-docente em ciências da comunicação pela Usp; é
presidente honorária da Federação Latino-Americana de Semiótica, diretora do
Centro de Investigação em Mídias Digitais (Cimid) da Puc-SP, membro
correspondente da Academia Argentina de Belas-Artes e presidente da Charles S.
Peirce Society, Estados Unidos, em 2007. Entre suas publicações estão: Culturas
e Artes do Pós-Humano – Da Cultura das Mídias à Cibercultura; Corpo e
Comunicação – Sintoma da Cultura; Linguagens Líquidas na Era da Mobilidade;
Navegar no Ciberespaço, Conectividade, Mobilidade, Ubiquidade, entre outros.
RENATA LEMOS
Especialista em cultura digital. Pesquisadora e aluna do Programa de
Doutorado em Comunicação e Semiótica da Puc-SP, com bolsa sanduíche pela Capes
na EGS, Suíça. É membro do coletivo de pesquisa internacional Space Collective
e associada a diversos think tanks no Brasil, Europa e Índia. Sua formação é
transdisciplinar, integrando arte, ciência e tecnologia.
Objetivos
dos capítulos
O foco de atenção deste
fichamento recai sobre os capítulos que centram suas analises nas especificidades
do Twitter. No capitulo 5, “Inflow vs.
Outflow: Twitter & Microdesign de ideias”, além da abordagem
introdutória sobre o assunto, incluindo uma tentativa de definir o que é o
Twitter, seu funcionamento e especificidades, o leitor encontrará uma
investigação acerca do surgimento de novos tipos de colaboração intelectual em
rede e o desenvolvimento de novas habilidades cognitivas propiciado e
incentivado por estas redes. Já no capitulo 6, ”Visualizando Laços Sociais no Twitter: O continuum na era dos fluxos”,
as autoras ilustram as formas de representar os fluxos informacionais e como
mapea-los. Por fim, o capitulo 7, ”QOTD,
por @Umairh: Micromídias Móveis e Inteligência Coletiva Global em Tempo Real”
analisa o uso do Twitter, como um espaço de dinâmicas sociais de inteligência
coletiva e de articulação de design colaborativo em tempo real. A referencia
principal do capitulo é a dinâmica Qotd.
Argumentação
Central:
A argumentação central
dos capítulos aqui apresentados é a de que o Twitter é uma Rede Social
particular. Ele possui características únicas e diferenciais em relação às
outras plataformas. De acordo com Santaella e Lemos, por suas especificidades,
o Twitter é ilustrativo das inúmeras mudanças provocadas pelas redes sociais de
internet e na maneira do ser humanose relacionar. Esta plataforma possibilita o
surgimento de novos tipos de colaboração intelectual em rede. Tal colaboração
caracteriza uma nova etapa de evolução nos processos de inteligência coletiva e
nas habilidades cognitivas mediadas por computador.
INFLOW VS. OUTFLOW: TWITTER & MICRODESIGN DE IDEIAS.
Tópico 1: O que é o Twitter: As autoras defendem a tese de que o Twitter é uma mídia social particular que apresenta características únicas em relação a outras plataformas de rede social de internet, tais como o Facebook e Orkut. O Twitter é entendido como um misto de rede social e microblogging, que unindo a mobilidade do acesso e a temporalidade do always on, possibilita o entrelaçamento de fluxos informacionais e o design colaborativo de ideias em tempo real, assim como levanta a necessidade de ações simultâneas de inteligência coletiva.
Tópico 2 - Inteligência
estratégica na inserção e sociabilidade de rede: Por ser o Twitter uma mídia social de interação
complexa, o processo de inserção de um usuário não é imediato. Este requer uma
habilidade estratégica e um planejamento anterior (sobretudo para marcas e
profissionais), baseado nas características específicas desta plataforma. As autoras trazem um dado de que
60% dos novos usuários abandonam o Twitter depois do primeiro mês de uso
(Martim, 2009). Estas taxas são bem superiores às registradas em outras redes
sociais, como Facebook e o Orkut. Isto pode ser entendido, em parte, pelo
Twitter não ser voltado às redes de contatos pessoais pré-existentes na vida offline, mas sim, proporcionar a
convergência, em um mesmo fluxo, de múltiplos fluxos informacionais. Segundo as
autoras, o sucesso da inserção nesta rede depende muito da qualidade do
conteúdo veiculado pelo usuário. As exceções neste caso seriam as celebridades
e os experts com público cativo.
Tópico 3
– Fluxos Informacionais: Inflow e Seleção de Fluxos.
No Twitter, o conteúdo informacional do fluxo interno (inflow) de um usuário é proveniente de suas escolhas de
alimentação. Quando seguimos alguém estamos fazendo uma "assinatura"
do seu canal de informação para o nosso fluxo pessoal, processo que as autoras
nomearam como: design personalizado do
inflow. Como cada pessoa seleciona
seu fluxo pessoal, baseado em preferências e objetivos particulares, este será
único e personalizado. O design interno (inflow)
depende de uma lenta avaliação e triagem dos perfis disponíveis no Twitter. Sua
configuração é processual e mutável, sendo este influenciado pelo tipo de
experiência midiática desejada pelo usuário. Existe um enorme número de
combinações possíveis de fluxo inflow
no Twitter, o que podem gerar os mais variados tipos de entrelaçamentos
informacionais.
Tópico 3.1: Fluxos
Informacionais: Outflow e Microdesign de Ideias. Se no Twitter a noção
de inflow, diz respeito à escolha de
acesso de um conjunto de canais emissores (recepção de conteúdo); a de outflow refere-se à distribuição de
informações por parte do usuário (produção de conteúdo). O tipo de conteúdo
veiculado pelo usuário através do Twitter irá depender de sua estratégia
pessoal de mídia, o que pode ser bastante variado. Ao compor sua estratégia de outflow no Twitter , o usuário(até mesmo
marcas e empresas) precisa ter em mente que está em ambiente relacional,
portanto este conteúdo deve ter um caráter pessoal e emocional; o que evidencia
o caráter conversacional da plataforma. O outflow
não é um canal estático e unidirecional, cada novo tweet penetra em um fluxo vivo, em continuo movimento, que se
renova em tempo real. O outflow é
interdependente – mistura elementos autorais, pessoais, indicações, links, e
elementos de edições em tempo real. De acordo com esta abordagem, cada usuário
do Twitter se transforma em um designer artesanal de ideias – ou
seja, este é o único responsável pela escolha de ideias e pensamentos que farão
parte de seu fluxo de outflow. O
design de ideias dentro do Twitter é um processo que entrelaça contribuições
individuais a outras, coletivas. Nesse
caso, em que a inteligência se expressa através do design colaborativo de
ideias, surge uma inteligência coletiva que se baseia não apenas no uso e
acesso aberto ao conhecimento disponibilizado coletivamente, mas sim, em
esquemas conceituais que começam a ser acessíveis apenas ao visualizarmos o
todo dessas microcolaborações (tweets
autorais, RTs, menções, links, pointers, hashtags, etc.)
Tópico
4:
Inteligência Cognitiva no Gerenciamento
de Atenção. A inserção aprofundada no Twittter requer um tipo de presença
digital continua do usuário, que necessita adquirir, de acordo Rheingold
(2009), um novo tipo de habilidade cognitiva de atenção denominada de attencion literacy ou infotention (infoatenção). As autoras citam novamente Rheingold, para
afimar que o gerenciamento de atenção bem sucedido dos fluxos
informacionais no período atual da internet requer habilidades cognitivas
hibridas que conectam inteligências humanas e artificiais. Segundo o autor, as habilidades cognitivas
que ajudam a gerenciar a complexidade dos fluxos informacionais são quatro:
participação, colaboração, filtragem, e presença consciente em rede. Esse
conjunto de habilidades cognitivas é denominada por Rheingold de mindful infotention (presença mental continuamente alerta). Neste
tópico, as autoras questionam como manter, com o caráter always on, com a ubiquidade do Twitter e com a quantidade de fluxos
informacionais, uma presença mental alerta, sem prejudicar a qualidade de vida
do "lado de cá" das redes; e como manter o ritmo de trabalho e a
concentração mental sem ser tragado por estes fluxos de infodistração.
VISUALIZANDO
LAÇOS SOCIAIS NO TWITTER: O CONTINUUM NA ERA DOS FLUXOS.
Tópico
1: Visualizando Laços Sociais no Twitter: As autoras
consideram não há um consenso sobre a verdadeira dimensão do impacto social do
Twitter e que ainda se vive (na época da escrita do texto) o momento de
expansão global da plataforma. Elas abordam o pensamento de Nussbaum (2009)
para quem o Twitter é percussor de um modelo interativo inédito que mistura “auto-publicação
e rede social”. Destacam a mudança dos tempos de ênfase na interatividade
humano e máquina, para a experiência direta de sociabilidade em rede mediada
por computador. Para as autoras o
Twitter diferencia-se de outras redes sociais, por seus laços sociais não serem
baseados em vínculos pré-existentes, mas sim em fluxos coletivos.
Tópico
2: Visualizando a sociabilidade em rede: Como representar fluxos? Neste tópico é abordado o choque existente na
passagem da era da “navegação” para a era dos “fluxos”. Na era dos fluxos não
há separação entre mundo virtual e o real, como nos anos 1990. Segundo as
autoras, isto implica numa reestruturação da arquitetura informacional da
internet em função dos laços sociais. Quanto mais especifico for um nicho
particular de comunidade, mais embutidos serão estes laços sociais. No entanto,
em um ambiente como o Twitter, onde existem comunidades mistas de emissores,
receptores e emissores-receptores de informação, a visualização é extremamente
complexa.
Tópico
3: Aplicativos de visualização: Mapeando Tramas de conexão social. Neste
tópico são mencionados aplicativos para mapeamento dos laços sociais no
ambiente digital. É abordada a teoria moderna dos “seis graus de separação”, as
quais prepararam o caminho para o desenvolvimento de vários programas como o
Vizster, com diferentes focos de visualização dos fluxos no Twitter. As autoras
se debruçam sobre três destes aplicativos de visualização de laços: O Foller, o
MentionMap e o Twitnest. O primeiro fornece informações restritas a um grupo de
seguidores. O segundo é um aplicativo que permite uma visualização baseada em
conversações e interação entre usuários. E o terceiro, mapeia relações entre os
membros de uma mesma rede.
QOTD,
POR @UMAIRH: MICROMÍDIAS MÓVIES & INTILGÊNCIA COLETIVA GLOBAL EM TEMPO REAL
Tópico
1: Evolução das funcionalidades &
aplicativos do twitter. De acordo com a pesquisa de
Santaella e Lemos, entre todas as outras plataformas sociais de uso
generalizado, como Orkut e Facebook, o Twitter é aquela que permite a multiplicação
mais acelerada de modos de conexão vinculados a temáticas especificas. Para
elas, ao contrário das redes sociais baseadas em perfis individuais com acesso
restrito, o Twitter é uma rede social de acesso completamente aberto, no qual a
grande maioria dos usuários é disponível a toda rede, permitindo a livre
apropriação e redirecionamento dos tweets.
Tal interação é baseada na combinação de três funcionalidades: Retweets (serve para mencionar um
conteúdo proveniente de outro autor); :
#Hashtags (indexadores de temas, acesso a fluxos coletivos); : Search: @usuário (ferramenta de bsuca
que permite acessar todas as mensagens que inluam o nome de determinado usuário
e acompanhar um fluxo pessoal).
Tópico
2: Tweet: micromídia pluridirecional & multiespacial As
três funcionalidades mencionadas no tópico anterior, inerentes à arquitetura
informacional do Twitter, em muitos casos, podem suceder-se simultaneamente.
Assim, um único tweet tem penetração
simultânea em fluxos individuais e/ou coletivos em tempo real. Isto caracteriza
a interatividade pluridirecionada desse micromídia móvel e permite a
multiplicação exponencial dos laços sociais em rede, atuando de forma similar a
uma rede de conexões neurais.
Tópico
3: Aplicativos para mobilidade . A expansão das
funcionalidades do Twitter é uma de suas características essenciais. Existem
vários aplicativos (chamados apps)
que acoplados a esta plataforma facultam a visualização múltipla de fluxos, a
participação sincrônica e formas personalizadas de interação em rede. Santaella
e Lemos citam Solis (2009) para lembrar que em 2007 havia apenas um Twitter app e dois anos depois eles já chegavam
a 50 mil. São exemplificados, entre outros, o Twitpic (app para fotografia), o Foursquare (app de rastreamento espacial) e Posterous (para postagens
automáticas de documentos, textos e vídeos).
Tópico
4: Microssintaxe. A característica do Twitter de
micromídia, com sua limitação de espaço textual de tweet em 140 caracteres possibilitou um sistema de microssintaxe
especifico. Além das três funcionalidades já mencionadas, outras foram
acrescentadas, como as chamadas slashtags:
/via , /by e /cc. Isso torna
evidente que um novo tipo de interação emerge em resposta às características
das micromídias e o seu uso efetivo se torna um requisito fundamental para
inserção de um usuário neste ambiente.
Tópico
5: A ecologia sociocultural do Twitter . As autoras
apresentam o argumento de Rheingold (2009) e Miemis (2009) de que, embora o
Twitter seja considerado uma única comunidade virtual, ele é bem mais entendido
como uma ecologia de comunidades integradas em um ecossistema flexível, no qual
comunidades são formadas ou dissolvidas à medida que o interesse por um tema
específico aumenta ou diminui. No Twitter, quanto maior for o leque de
interesses de um usuário maior será a gama de usuários aos quais ele irá se
relacionar. Isso faz com que a ecologia cultural de hábitos interativos desta
plataforma seja extremamente diversificada e esteja em constante adaptação.
Tópico
6: Design colaborativo via Twitter: Arte, inteligência coletiva &
entrelaçamento social. O Twitter tem servido para diversas
comunidades experimentarem novas formas de interação. Através das #hashtags muitos conteúdos tem servido
como apêndice das mídias massivas. Também surgem nichos de comunidades
acadêmicas, artísticas e/ou profissionais, onde surgem demonstração de
inteligência coletiva e design colaborativo do Twitter. As autoras citam quatro
exemplos de interação colaborativa: 1 - #FF (Follow Friday) - surge as sextas
feiras e os usuários sugerem pessoas a serem seguidas; 2 - #draw365 – comunidade de artistas para postar seu desenhos
diariamente; 3 - #journchat –
encontro virtual com hora marcada e temática especifica; e 4 - #MonTwit –
metadiscussão sobre o Twitter dentro do Twitter.
Tópico
7: QOTD, por @umairh. A hashtag #qotd tem sido usada no
Twitter, de forma geral, para se referir a já clássica “Quote Of The Day”, mas
possui outro significado na programação computacional. Qotd é um protocolo
padrão que objetiva levantas informações e medidas sobre um dado ambiente
digital. O experimento qotd em
inteligência coletiva através do Twitter foi articulado por Umair Haque. O
autor tem efetuado uma revisão dos princípios operacionais do capitalismo no
século XXI, através de ideias como “valor magro” vs. “valor denso”, com críticas a economia moderna, a qual ele se
refere como “economia zumbi”. Umair criou a palavra “midiaconomia” (mediaconomy) para se referir a tensão
entre os modelos de geração de renda utilizados pela estrutura comercial fechada da mídia de massa vs a estrutura aberta e livre
da mídia digital.
Tópico
8: Implicações práticas e teóricas do QOTD
O qotd
enquanto instância representativa de um novo tipo de interatividade em rede, na
qual o entrelaçamento social dá origem a outros entrelaçamentos – globais,
conceituais, culturais e políticos -, aponta para as seguintes tendências: 1 -
a constatação de certo descaso das mídias de massa em relação a determinados
aspectos da pauta temática, torna a obtenção de informações via rede, ainda
mais importante; 2 - a interação social em rede proporciona seleção instantânea
de lideranças intelectuais; e 3 – o design colaborativo de estratégias coletivas
de interação social em rede com vistas na produção de um resultado específico.
Diante destas noções, para as autoras, uma nova dinâmica de validação e
reputação e está surgindo dentro do Twitter. E esta plataforma tem sido usada
como um vértice intercultural, na qual expressões verdadeiramente
transculturais começam a surgir como manifestações espontâneas de interação
social.
Tópico de Conclusão: A presente pesquisa
é uma tentativa de olhar de frente para algumas questões centrais que as redes
sociais trouxeram a tona nos últimos anos.
Entre as conclusões apontadas pelas autoras, está o fato de que a utilização
bem sucedida do Twitter exige não apenas a fluência em relação aos seus códigos
de uso, mas principalmente o desenvolvimento de uma estratégia consciente de
quais são os objetivos e resultados que se pretende alcançar com tal rede.
Outra importante constatação da pesquisa foi identificar a interdependência
entre os upgrades da estrutura de suporte tecnológico e as novas estratégias de
sociabilidade em rede. Alguns potenciais do Twitter também foram apontados,
tais como o ciberpolítico e o senso de cidadania global compartilhado.
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