SCHLENKER,
Barry. Self-Presentation. In LEARY, Mark.; TANGNEY, June. Handbook of Self and Identity. The Guilford Press, New
York, 2003. (p. 492 - 518)
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Por
Flora Couto e Samantha Rebelo
Sobre o autor:
SCHELERN,
Barry R.: Professor Emérito do departamento de psicologia da
Universidade de Gainesville na Flórida. Fellow de diversas associações e institutos como o
American Psychological Association (Divisions 3, 8, and 9); Association
for Psychological Science; Society for Personality and Social Psychology. Revisor,
Consultor editorial em diversas revistas e jornais científicos, dentre eles: Psychological Review; Psychological Bulletin;
American Psychologist; Journal of Personality and Social Psychology:
Interpersonal Relations and Group Processes. Leciona
e pesquisa as linha de interesse: Gerenciamento de impressão e auto-apresentação;
Identidade Moral e integridade; Self e identidade; Responsabilidade pessoal e
influência social; Poder e Persuasão. Autor e co-autor de diversos livros: Schlenker,
B. R. (1976). Social
psychology and science: Another look. Personality
and Social Psychology Bulletin, 2, 384-390 - Schlenker, B. R. (1975).
Self-presentation: Managing the impression of consistency when reality
interferes with self-enhancement.Homepage: http://www.psych.ufl.edu/~schlenkr/vita.htm e-mail: schlenkr@ufl.edu
Objetivos
do capítulo: O presente texto apresenta
resultados de pesquisas em psicologia social, clínica, sociologia e áreas afins
ao longo de 25 anos; dentro do marco teórico do Interacionismo Simbólico - que
buscam explorar o tema do gerenciamento
de impressão e auto apresentação. A intenção do autor é revisitar os
principais constructos que sustentam a teorização em torno do gerenciamento por
controle das informações, no sentido de manejar as impressões que emergem nas
negociações simbólicas interpessoais e grupais. O autor delimita
conceitualmente a auto-apresentação, quando o gerenciamento feito por um
locutor, tem como intuito persuadir o interlocutor a formar uma representação
identitária desse locutor; que seja a mais próxima de sua intencionalidade,
imediata ou antecipadamente planejada. O autor desenvolve a conceituação da auto-apresentação
como um comportamento social, complexo, autômato e controlado, consciente e
inconsciente, verbais e não-verbais, operando em devir na construção do entre das relações eu - outro social; e, dessa forma, mediado pela ambiência
sócio – cultural - histórica. Para delimitar o constructo, o autor, circunscreve suas intuições teóricas em torno
das variáveis intervenientes Situação,
Aspectos do self, Público; dentro de uma perspectiva de atributos individuais e do aspecto transacional na construção e
função dos significantes identitários na
expressão da auto-apresentação. O
autor marca Erving Goffman, como um dos mais
renomados pesquiadores da área; e dentro da sua vasta contribuição, está o livro ‘The presentention of self in
everyday life (1959).
Argumentação Central: O que são
e para que servem as auto-apresentações? Em nome de responder a essa pergunta,
o autor centra seu argumento em torno da explicação, via teoria do Interacionismo Simbólico, de como se
processa a ancoragem do Self nas
interrelações sociais imediatas e planejadas, reais ou antecipatórias. As
pesquisas levantadas pelo autor argumentam que o Self é um ente construído socialmente nas interrelações
continuadas, cujo processo de formação é a mediação cognitiva. Cognição, sendo
aqui entendido como esquemas conceituais de orientação interna que se auto-
regulam continuadamente, via percepção seletiva de estímulos sensórios; que são
guiados pela intencionalidade consciente ou inconsciente, controlados ou
autômatos dirigidos para configuração de auto-conceitos, auto-imagens, crenças.
Essas configurações de esquemas são definidores da percepção de si mesmo no
mundo, do Self, dos outros sociais, e de um público em geral. Os estímulos
perceptuais selecionados são entendidos pelos Interacionistas Simbólicos, como informações carreadas de signos,
significados, significantes mutuamente compartilhados em sociedade; que são
permanentemente negociados simbolicamente, para manutenção do enlaçamento
social e construção de processos identitários, os mais genuínos, criativos e
adaptativos, que se equiparem à imagem do Self preferencial. A chave da
argumentação é que esse fenômeno, pregnante no entre das relações, pode ser
gerenciado em suas cadeias de concatenações simbólicas, para gestar as
impressões que um Self deseja
associar a sua imagem identitária em um dado contexto, com um dado público: a
esse comportamento social é dado o nome auto-apresentação.
Tópico 1
– Artimanhas e autenticidade: O autor inicia sua aproximação na conceituação do
tema tentando levantar e distinguir as percepções mais restritivas e abrangentes
sobre auto-apresentações; delimitando dois eixos centrais quanto as percepções
de uso ou função: 1. a percepção de que a auto-apresentação pode ser
erradamente vista, restritivamente, como um recurso de ‘artimanhas’, no uso do
jogo social (ex. políticos, vendas,
ascensão social, crimes), cuja a função seria
uma atividade superficial, fortuita, enganadora, decepcionante ou manipulativa; 2. também envolve uma percepção de que a
auto-apresentação tem a função de comunicar a um público um perfil de alguém,
genuinamente autêntico, crível pela pessoa que age, como verdadeiro - e que pode ser usada para realizar objetivos
interpessoais, apenas influenciando as respostas dos outros para si. Seguindo a
reflexão, o autor aponta que as auto-apresentações são de ordens diferentes,
que co - existem; mas não se excluem,
nem preponderam umas sobre as outras. O autor continua explorando que mesmo com
usos e funções diferentes, as pesquisas apontam que o processo de formação da
auto-apresentação requer o mesmo objetivo genérico: o objetivo de ser incluso
socialmente, gratificar e ser gratificado psicologicamente e materialmente;
construir e assegurar uma identidade pública preferencial, dentre outros ganhos
na relação interpessoal. Segundo Schlenker (2003) Interacionistas simbólicos
como Mead(1934) e Cooley(1902) estão entre os primeiros a enfatizar que ações
carregam significados simbólicos que influenciam as respostas dos outros ao
self. O autor levanta várias pesquisas de teóricos do Interacionismo Simbólico
que apontam que as negociações simbólicas podem ser reais ou antecipatórias a
um dado encontro social; e são influenciadas por diversos motivos desde poder,
vínculo, atenção, controle, tempo, forma, que impactam o conteúdo da atividade
das auto-apresentação. Segundo Schlenker (2003), Goffman(1959) elaborou o tema
quando ele descreveu a vida social como sendo uma série de atos nos quais a
pessoa projeta suas identidades ou “faces” para os outros e se engatam em
atividades mútuas que são governadas pelas regras sociais e rituais. Para o
autor, esse processo de construção de um self identitário, nos engates dos
encontros com os outros sociais, nas auto-apresentações, sempre ocorrem; mesmo
que para isso os fins sejam um self enganoso(artimanhas) ou um self
genuíno(autenticidade).
Tópico 2 – Processos
autômatos e controlados na auto-apresentação: Segundo Schlenker(2003)
a auto-apresentação, como todo comportamento social, pode variar em um contínuo
de expressão de um comportamento automático à processos controlados de acordo
com o espectro de consciência e processos cognitivos
envolvidos. Para o autor, o processo automatizados
ou autômato, são hábitos que operam fora da consciência, são involuntários –
sem percepção de sua intencionalidade, fluxo, impacto da atividade da
auto-apresentação - e pouco esforço cognitivo, e não são conscientemente
controlados depois de iniciados. Dessa forma, os processos controlados, em
polaridade, são voluntários, conscientes, permeados por processos cognitivos
intencionalmente motivados e dirigidos para
meta - ou quando está diante de determinados tipos
de audiências que sejam significantes para o self; na intencionalidade de obter
controle sobre as impressões que se deseja impactar no público. Os processos
automáticos nas auto-apresentações ocorrem em atividades que envolvem
motivacões familiares, rotinas, scripts ou comportamentos aprendidos e
reforçados em que os laços sociais não oferecem ameaça ao seu processo
identitário: por não apresentarem metas específicas ou por serem contextos
conhecidos, dispensam controle e pouco envolvem processos conscientes já que
não estimulam no ator uma preocupação maior em causar boa impressão.
Segundo Schlenker(1980,1985); Schlenker,Britt & Pennington, 1996) estes
sugerem que alguns padrões de forma de auto-apresentação roterizam o guia de
ação, usualmente demaneira não pensada, em situações relevantes. Esses roteiros
do self são incorporado sem um amplo roteiro cognitivo(Abelson, 1976) que ajuda
pessoas a negociar situações sociais. Processos autômatos também podem ocorrer
em resposta à uma sobrecarga de
informção circulante, ou pressão do momento,
interferindo com processos
coginitivos habituais - os scrippts sociais - que se tornam disfuncionais e
disparam comportamentos inconsciente, novos roteiros; por características específicas
do público e da situação, e onde o sujeito parece não dimensionar a extensão
que o tal comportamento é influenciado pelo tal contexto social e suas próprias
metas interpessoais (Jones, 1990; Schlenker, 1980, 1985; Tetlock 7 Manstead,
1987). Ou seja,
mesmo operando no modo autômato, não existe um
self-consciente atento ao controle de impressão feita em resposta aos outros;
pórem, há uma atividade objetivada de
contruir e proteger uma identidade que se estabelece diante de um contexto,
situação e audiência.
Tópico 3
– Configurando
a auto-apresentação - desenhando uma auto-apresentação desejada a partir do
Self, Público e Situação: o autor circuncreve a
configuração da auto-apresentação mediada por um engendramento transacional de
informações oriundas de 3 eixos que são eles a audiência, da situação
específica, e dos aspectos do self (traços da personalidade, recursos
mnêmonicos da história do sujeito e de personalidades de referências
arquetípicas); dentro uma intencionalidade das metas e dos dimensionamentos do
grau de relevância(razão, tamanho) dos contextos envolvidos. Para construir comportamentos identitários
desejáveis a partir desses eixos, o autor revisa pesquisas que apontam objetos
transicionais que encorpam, dão sentido e são facilitdores dessa construção: a.
o reforçamento da auto-estima, como fator de ancoramento de uma auto-imagem
positiva e socialmente desejada; b. o reforçamento da consistência interna do
Self, confirmando crenças de si mesmo que sustentam a face identitária do
sujeito; c. organizar alvos, metas e motivações que intencionem comportamentos
da audiência e do self do sujeito; que representem consequência benéfica,
acreditavéis, e com credibilidade (para não haja
sofrimento de sanções pessoais e interpessoais de forma que o indivíduo busque
apresentar informações de si que seja capaz de manter a integridade
identitária). Então parece não existir constância nem linearidade no
estabelecimento de uma imagem particular do Self; já que inúmeros são os
fatores que modificam a auto-apresentação para que se torne apropriada conforme
o contexto. Diante dessa impermanência, inconstância, e mútua interferência do
tripé Self – audiência – contexto; podemos pensar que o intercâmbio entre as
experiências privadas e públicas, de caráter representativo para o Self, pode
cumprir uma função de troca simbólica com rede de afetação passível de
ressignificação dos esquemas cognitivo de referência interna e externa do
sujeito. Nesse sentido, o autor defende a teoria de que o Self parece se auto-regular nas fronteiras de contato
com esses eixos acima tipificados, de maneira a se colocar no lugar do outro,
empatizar, perceber os sinais que sejam frutos de um encontro real, no ato de
construção imediata; ou de modo antecipado( antes da auto-apresentação se
operar no encontro com os outros sociais). Para Schlenker (2003) a
auto-regulação nas auto-apresentação são guiada em parte pela pressão das
audiências e contextos sociais (orientações extrínsecas) e por outra, pelo valores
e crenças do indivíduo (orientações intrínsecas); podendo ocorrer, ambas,
concomitantemente, sem uma sobrepor a outra e trazendo rede de impacto caso se
polarizem. As orientações extrínsecas e intrínsecas estão vinculadas,
respectivamente, a autoconsciência pública e/ou privada que o indivíduo
apresenta e, independente de qual seja, as audiências irão influenciar na
auto-apresentação deste por razões distintas. Essas
impactações podem também surgir de situações em que as pessoas se encontram com
suas identidades ameaçadas por razão de um erro ou incidente, não previsto em
suas auto-apresentações. Como consequência são disparados novos rearranjos na
tentativa do Self de buscar remediar a imagem identitária ameaçada através de
estratégias de evitação de responsabilidade, defesa da inocência, desculpas e
justificativas. Schlenker (2003) a eficácia da
auto-apresentação irá depender de quão esses eixos estão alinhados e acessam
relações benéficas: que mantenham o bem-estar das relações interpessoais,
sustentadas em imagens e condutas não enganosas; em situações de segurança; sem
ameaças simbólicas à desconstrução ou desorganização da constelação identitária
preferencial do Self. O autor salienta uma função benéfica e social das
auto-apresentações, quando esta media a aliança de cuidado entre pessoas ou
grupos sociais com metas comuns, proximidade, e representatividade simbólica;
via construção e proteção recíproca de suas imagens identitárias.
Schlenker(2003) Goffman (1967) postula duas regras necessárias para esse fim: o
auto-respeito (integridade da pessoa com ela mesma) e a consideração
(integridade da pessoa com o outro).
Tópico 5 - Implicações Teóricas:
O levantamento bibliográfico indicou um campo de pesquisa vasto e com uma
amplitude de implicações dos resultados. Segundo Schlenker (2003), o
pesquisador Jones(1964), descreveu a auto-apresentação como uma das 4 táticas
de integração - em conjunto com lisonja, conformação de opinião, execução de
favores - que mais eficientemente eliciam respostas de atos de amor disparadas
pelo poder dos outros. Através da revisão prospectada sobre o gerenciamento de
impressão, via auto-apresentação, é possível perceber que os resultados
apontados possuem um potencial de transversalidade nas diversas áreas do
conhecimento que tenham a produção de subjetividade e grupos sociais como
objetos de pesquisa e de aplicabilidade profissional. Apenas como exemplo simplório, podemos ver a
aplicação conceitual na área de educação, gerenciando as impressões, via
auto-apresentação nas relações professor – aluno.
Tópico 6 - Limitações e Direcionamentos Futuros:
para Schlenker (2003) a pesquisa em auto-apresentação produziu muita
informação, mas gerou probabilidades de futuros desdobramentos de pesquisa,
dado ser o fenômeno uma complexidade com muitas interconexões de campos de
saber. Essa mesma complexidade do objeto de estudo pode apontar limitações
quanto à delimitação dos procedimentos científicos, condicionando a intuição teóricas a reduzida
possibilidade de generalizações; se principalmente pensarmos em ambiências
transculturais. Segundo Schlenker (2003) a auto-apresentação como tema
científico por muito tempo ficou com o uso restrito, que é focado na
manipulação, em um lado ilícito da auto-apresentação; mas que o objetivo
singular da mente que é ser gostado, é ainda o caminho que os pesquisadores devem focar o termo para futuras pesquisas.
Hoje, então, pesquisar em auto-apresentação cobre muito mais. Auto-apresentação
tem emergido como um importante e funcional conceito em psicologia social; e parece
ser possível problematizar se elas poderiam ser indicadores dos sentidos de
pertença nos agrupamentos sociais, e ferramenta de promoção de diversidade
criativa na vida cultural de uma sociedade.
Tópico 7 - Conclusão: O autor pontua que a auto-apresentação é um comportamento social, que ao ser instrumentalizado de forma consciente, pode servir a uma ferramenta para a interação social benéfica - que ajudam os outros a construir e proteger suas identidades desejadas – e um recurso reflexivo para uma atitude crítica, quando envolve atividades manipuladoras, egoístas, destinadas a explorar outros. Nesse sentido a negociação simbólica, mediada cognitivamente, emocionalmente, sensoriamente dentro dos grupos sociais, exige uma noção de self individual indissociável do interrelacional. Assim, o conceito de auto- apresentação, ganha uma dimensão importante - estando em perspectiva individual e/ou transacional, e sendo um comportamento social - na função processual de organização das metas interpessoais, e no estabelecimento de roteiros identitários; oriundos de aporte sócio-culturais expressos em seus rituais e pactos de consenso de convivialidade. Podemos então concluir, que as pesquisas sobre auto-apresentação apontam para esta ser um constructo de grande relevância para compreensão do fenômeno subjetivo, da comunicação social e dos comportamentos sociais como um todo.
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