domingo, 1 de abril de 2012

Fichamento - Identidade e Self [texto 1]

BURKITT, Ian. Social Selves – Theories Of Self And Society. SAGE Publications Inc. Thousand Oaks, California. 2008. p. 162-186.
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SELF IN CONTEMPORANY SOCIETY


Por Marcel Ayres

Sobre os autores:
IAN BURKITT, psicólogo britânico, pesquisador no departamento de Ciência Social e Humanidades na Universidade Bradford. Autor do livro Social Selves: Theories of the Social Formation of Personality (1991).

Objetivos do capítulo: No texto, Ian Burkitt irá explorar e questionar ideias que tentam explicar o mundo contemporâneo e quais são as implicações das transformações ocorridas ao longo do tempo para a compreensão do Self, ou seja, possibilidades e limitações na construção identitária diante de um contexto social fragmentado e multifacetado.

Argumentação Central: Burkitt discorre sobre como as transformações do mundo contemporâneo, não apenas econômicas, mas, também, científicas, tecnológicas e comunicacionais, mudaram o entendimento do Self, deixando de ser compreendido como algo individual, inerente ou imutável, e passando a ser encarado como um constructo contínuo imerso em fluxos de informações (levando em consideração a diversidade de meios aos quais estamos expostos atualmente) e as interações entre indivíduos com diferentes estilos de vida, valores, culturas, visões de mundo etc..  Essa perspectiva pós-moderna põe em cheque a pergunta “quem sou eu?” uma vez que nossas identidades passam a ser múltiplas e com variadas possibilidades em potencial.  Ou seja, uma vez que temos, no mundo globalizado e conectado, acesso a diversas fontes de Selves, a noção de uma identidade estável e segura se torna, cada vez, menos provável.


Tópico 1 – Social Saturation and the Saturated Self
Neste tópico, Burkitt recorre a autores como Benneth Gergen, Anthony Giddens, Georg Mead e Mikhail Bakhtin para tratar do Self no cenário pós-moderno.

Segundo Gergen, um dos fatores-chave para a transformação social do mundo contemporâneo são as chamadas “Technologies of Social Saturation” (Tecnologias da Saturação Social) – ou seja, uma explosão de tecnologias da comunicação e da informação as quais estamos expostos e nos oferta uma multiplicidade de conhecimentos, culturas, religiões, visões de mundo, ideias, valores, estilos de vida e pessoas. Neste cenário, Burkitt cita como é possível que pessoas de diferentes lugares do mundo, através da internet, por exemplo, possuam mais proximidade do que vizinhos de porta – mostrando como a questão do local geográfico não se torna mais um limitador nas interações sociais e na construção do Self.

Relembrando G. Mead e Mikhail Bakhtin, Burkitt diz que esses autores argumentaram que o Self é construído através da relação com o outro, contudo, eles se basearam apenas na relação face-a-face. Pensando a atualidade, as tecnologias da comunicação citadas por Bergen nos colocariam em contato com diversas vozes e formas de viver, indo além das experiências imediatas e ampliando o nosso leque de referências identitárias.

Burkitt, ainda no que diz respeito às ‘tecnologias da saturação social’, fala sobre como a mídia possibilita, hoje em dia, intimidades entre pessoas que não se conhecem e, até mesmo, com personagens e figuras imaginárias.

O Self pós-moderno, então, transcende o Self Modernista e o Self Romântico descritos pelos filósofos do século 17 e 18. O modernismo descrevia o Self enquanto algo racional, enquanto, por sua vez, os românticos achavam que o Self se originava ‘dentro de si’, como uma voz essencial que nos diz quem somos e como devemos agir.

No mundo contemporâneo e pós-moderno, o senso de um Self coerente e perene desaparece no fluxo da fragmentação social e das interações contínuas com os outros.

Tópico 2 – Self Identities in High Modernity

No segundo tópico, Burkitt irá retomar reflexões realizadas por Anthony Giddens acerca das mudanças sociais contemporâneas e sua relação com a construção da identidade.

Segundo Burkitt, Giddens concorda com Benneth Gergen no que diz respeito ao efeito das mudanças sociais contemporâneas no Self. Devido a fatores, tais como a ciência, tecnologia, indústria e comunicação dificilmente o estilo de vida continua o mesmo de uma geração para a outra.

No século 18 e 19, por exemplo, a noção do Self ainda estava centrada em valores construídos no feudalismo, como a ideia de ‘saber o seu lugar na sociedade’, o valor da comunidade local, a santidade da família etc.. No século 20 e 21, conforme aponta Giddens, vivemos a modernidade tardia ou "alta" modernidade, na qual fatores como a mobilidade geográfica mudam estruturas de classe e transcendem as comunidades locais, gerando uma maior variedade de estilos de vida que podemos adotar. Isso tornou possível a emergência de novos modelos de Self - a família, por exemplo, indo além de uma estrutura nuclear (pai, mãe e filhos). Com o crescimento do consumismo, o colapso da estrutura tradicional das famílias e a pluralidade dos estilos de vida urbanos, há, também, uma mudança nas categorizações binárias criadas para questões de gênero e sexualidade.

Giddens também fala sobre como a questão do tempo e do espaço, em um mundo globalizado, faz com que a noção do "local" perca a importância na estruturação dos relacionamentos e das ações sociais. Hoje, principalmente através das tecnologias da comunicação e da informação, é possível construir relacionamentos, movimentos etc. que independem das constrições do tempo e espaço.
No final do segundo tópico, Ian Burkitt aponta um problema na tese de Giddens sobre a construção do Self pós-moderno. Giddens defende a ideia de que a construção do Self - a adoção de um estilo de vida - seria uma escolha individual, ignorando contribuições de pesquisadores como Mead e Bakhtin que já haviam apontado que o Self seria uma construção negociada nas relações que estabelecemos com os outros. Ou seja, o Self não pode estar desconectado da forma como os outros nos vêem.

Tópico 3 – Self in Liquid Modernity and the “new capitalism”

No último tópico, Burkitt cita obra de Zygmunt Bauman – para o qual a identidade está ligada a duas mudanças que ocorreram no final do século XX e início do XXI:

Globalização, em que pessoas e dinheiro não estão mais ligados a locais e, sim, a comunicações, trocas, identificações etc.;
Maior flexibilidade nas vidas das pessoas - mais fácil de trocar de trabalho, de se mudar de cidade, país etc.

Modernidade Líquida - liquefaz as interconexões estáveis - fluidez mediante espaço e tempo globalizado. Conexão e reconexão. Exemplo: mobile.

Dilema: devemos ter uma parte imutável para que pessoas nos conheçam e, ao mesmo tempo, o mundo fluido demanda adaptação das pessoas - elas têm que estar preparadas.

Para Bauman, aquelas que são incapazes de mobilidade e tem relativa estabilidade identitária são os membros menos poderosos da modernidade líquida. Poderosos, então, seriam aqueles que se movem e respondem a essas condições.

Processo de se tornar ‘individual’, ter uma identidade própria, mudou. Bauman sugere que a natureza do poder e da autoridade mudaram. Nossas terapias são comprar novas identidades entre modas e ofertas. “Quem não pode, fica em guetos”.

De acordo com Bauman, as autoridades deixaram a construção identitária para escolhas individuais, numa sociedade dominada pelo mercado, para que eles sem poder de escolher sejam deixados para trás. Isso caracteriza o processo de individualização na modernidade líquida.

Apesar disso, Bauman oferece esperança. Primeiro, a globalização oferece uma oportunidade para as pessoas começarem a se identificar como seres humanos como um todo - pela primeira vez, nossos interesses começam a apontar na mesma direção. Ou seja, não é ser contra a globalização, é achar um jeito de controlar a globalização selvagem. Segundo, por mais que as identidades tenham virado comodities, eles nunca tomarão o lugar de seres humanos. “Só seres humanos inspiram amor, amizade etc.”

Isso faz, contudo, questionar algumas ideias de Bauman sobre a natureza da identidade contemporânea - se as pessoas procuram por amor e amizade, entre outros, deve haver algo nos indivídios que busca resistir à modernidade líquida - e a procurar alguma estabilidade, comprometimento, comunidade etc.

Dizer que uma sociedade é fexível e fluida, exceto por aqueles que são excluídos da sociedade, é uma forma simplista de reducionismo social.

Por fim, Burkitt aponta que as pessoas estão achando jeitos de criar estratégias alternativas de vida, que resistem à fragmentação trazida pelo capitalismo contemporâneo - dá coerência à narrativa do Self.

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