BURKITT, Ian. Social Selves – Theories Of Self And Society. SAGE Publications Inc. Thousand Oaks, California. 2008. p. 162-186.
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SELF IN CONTEMPORANY SOCIETY
Por Marcel Ayres
Sobre os autores:
IAN
BURKITT, psicólogo britânico, pesquisador no departamento de Ciência Social e
Humanidades na Universidade Bradford. Autor do
livro Social Selves: Theories of the
Social Formation of Personality (1991).
Objetivos
do capítulo: No texto, Ian Burkitt irá explorar e questionar
ideias que tentam explicar o mundo contemporâneo e quais são as implicações das
transformações ocorridas ao longo do tempo para a compreensão do Self, ou seja, possibilidades e
limitações na construção identitária diante de um contexto social fragmentado e
multifacetado.
Argumentação Central: Burkitt discorre sobre como as transformações do
mundo contemporâneo, não apenas econômicas, mas, também, científicas,
tecnológicas e comunicacionais, mudaram o entendimento do Self, deixando de ser compreendido como algo individual, inerente ou
imutável, e passando a ser encarado como um constructo contínuo imerso em fluxos
de informações (levando em consideração a diversidade de meios aos quais
estamos expostos atualmente) e as interações entre indivíduos com diferentes estilos
de vida, valores, culturas, visões de mundo etc.. Essa perspectiva pós-moderna põe em cheque a
pergunta “quem sou eu?” uma vez que
nossas identidades passam a ser múltiplas e com variadas possibilidades em
potencial. Ou seja, uma vez que temos,
no mundo globalizado e conectado, acesso a diversas fontes de Selves, a noção de uma identidade
estável e segura se torna, cada vez, menos provável.
Tópico 1 – Social Saturation and the Saturated Self
Neste tópico, Burkitt recorre a autores como Benneth Gergen, Anthony
Giddens, Georg Mead e Mikhail Bakhtin para tratar do Self no cenário
pós-moderno.
Segundo Gergen, um dos fatores-chave para a transformação social do
mundo contemporâneo são as chamadas “Technologies of Social Saturation”
(Tecnologias da Saturação Social) – ou seja, uma explosão de tecnologias da
comunicação e da informação as quais estamos expostos e nos oferta uma multiplicidade
de conhecimentos, culturas, religiões, visões de mundo, ideias, valores,
estilos de vida e pessoas. Neste cenário, Burkitt cita como é possível que
pessoas de diferentes lugares do mundo, através da internet, por exemplo,
possuam mais proximidade do que vizinhos de porta – mostrando como a questão do
local geográfico não se torna mais um limitador nas interações sociais e na
construção do Self.
Relembrando G. Mead e Mikhail Bakhtin, Burkitt diz que esses autores
argumentaram que o Self é construído
através da relação com o outro, contudo, eles se basearam apenas na relação
face-a-face. Pensando a atualidade, as tecnologias da comunicação citadas por
Bergen nos colocariam em contato com diversas vozes e formas de viver, indo
além das experiências imediatas e ampliando o nosso leque de referências
identitárias.
Burkitt, ainda no que diz respeito às ‘tecnologias da saturação social’,
fala sobre como a mídia possibilita, hoje em dia, intimidades entre pessoas que
não se conhecem e, até mesmo, com personagens e figuras imaginárias.
O Self pós-moderno, então,
transcende o Self Modernista e o Self Romântico descritos pelos filósofos
do século 17 e 18. O modernismo descrevia o Self
enquanto algo racional, enquanto, por sua vez, os românticos achavam que o Self se originava ‘dentro de si’, como uma
voz essencial que nos diz quem somos e como devemos agir.
No mundo contemporâneo e pós-moderno, o senso de um Self coerente e perene desaparece no fluxo da fragmentação social e
das interações contínuas com os outros.
Tópico 2 – Self Identities in High Modernity
No segundo tópico, Burkitt irá retomar reflexões realizadas por Anthony
Giddens acerca das mudanças sociais contemporâneas e sua relação com a
construção da identidade.
Segundo Burkitt, Giddens concorda com Benneth Gergen no que diz respeito
ao efeito das mudanças sociais contemporâneas no Self. Devido a fatores, tais como a ciência, tecnologia, indústria
e comunicação dificilmente o estilo de vida continua o mesmo de uma geração
para a outra.
No século 18 e 19, por exemplo, a noção do Self ainda estava centrada em valores construídos no feudalismo,
como a ideia de ‘saber o seu lugar na sociedade’, o valor da comunidade local,
a santidade da família etc.. No século 20 e 21, conforme aponta Giddens, vivemos
a modernidade tardia ou "alta" modernidade, na qual fatores como a
mobilidade geográfica mudam estruturas de classe e transcendem as comunidades
locais, gerando uma maior variedade de estilos de vida que podemos adotar. Isso
tornou possível a emergência de novos modelos de Self - a família, por exemplo, indo além de uma estrutura nuclear
(pai, mãe e filhos). Com o crescimento do consumismo, o colapso da estrutura
tradicional das famílias e a pluralidade dos estilos de vida urbanos, há,
também, uma mudança nas categorizações binárias criadas para questões de gênero
e sexualidade.
Giddens também fala sobre como a questão do tempo e do espaço, em um mundo
globalizado, faz com que a noção do "local" perca a importância na
estruturação dos relacionamentos e das ações sociais. Hoje, principalmente
através das tecnologias da comunicação e da informação, é possível construir
relacionamentos, movimentos etc. que independem das constrições do tempo e
espaço.
No final do segundo tópico, Ian Burkitt aponta um problema na tese de
Giddens sobre a construção do Self pós-moderno.
Giddens defende a ideia de que a construção do Self - a adoção de um estilo de vida - seria uma escolha
individual, ignorando contribuições de pesquisadores como Mead e Bakhtin que já
haviam apontado que o Self seria uma
construção negociada nas relações que estabelecemos com os outros. Ou seja, o Self não pode estar desconectado da forma
como os outros nos vêem.
Tópico 3 – Self in Liquid Modernity and the “new capitalism”
No último tópico, Burkitt cita obra
de Zygmunt Bauman – para o qual a identidade está ligada a duas mudanças que
ocorreram no final do século XX e início do XXI:
Globalização, em que pessoas e
dinheiro não estão mais ligados a locais e, sim, a comunicações, trocas,
identificações etc.;
Maior flexibilidade nas vidas das
pessoas - mais fácil de trocar de trabalho, de se mudar de cidade, país etc.
Modernidade Líquida - liquefaz as interconexões estáveis
- fluidez mediante espaço e tempo globalizado. Conexão e reconexão. Exemplo:
mobile.
Dilema: devemos ter uma parte imutável para
que pessoas nos conheçam e, ao mesmo tempo, o mundo fluido demanda adaptação
das pessoas - elas têm que estar preparadas.
Para Bauman, aquelas que são incapazes
de mobilidade e tem relativa estabilidade identitária são os membros menos
poderosos da modernidade líquida. Poderosos, então, seriam aqueles que se movem
e respondem a essas condições.
Processo de se tornar ‘individual’, ter
uma identidade própria, mudou. Bauman sugere que a natureza
do poder e da autoridade mudaram. Nossas terapias são comprar novas identidades
entre modas e ofertas. “Quem não pode, fica em guetos”.
De acordo com Bauman, as autoridades
deixaram a construção identitária para escolhas individuais, numa sociedade dominada
pelo mercado, para que eles sem poder de escolher sejam deixados para trás.
Isso caracteriza o processo de individualização na modernidade líquida.
Apesar disso, Bauman oferece
esperança. Primeiro, a globalização oferece uma oportunidade para as pessoas
começarem a se identificar como seres humanos como um todo - pela primeira vez,
nossos interesses começam a apontar na mesma direção. Ou seja, não é ser contra
a globalização, é achar um jeito de controlar a globalização selvagem. Segundo,
por mais que as identidades tenham virado comodities,
eles nunca tomarão o lugar de seres humanos. “Só seres humanos inspiram amor,
amizade etc.”
Isso faz, contudo, questionar algumas ideias de Bauman sobre a natureza
da identidade contemporânea - se as pessoas procuram por amor e amizade, entre
outros, deve haver algo nos indivídios que busca resistir à modernidade líquida
- e a procurar alguma estabilidade, comprometimento, comunidade etc.
Dizer que uma sociedade é fexível e fluida, exceto por aqueles que são
excluídos da sociedade, é uma forma simplista de reducionismo social.
Por fim, Burkitt aponta que as pessoas estão achando jeitos de criar
estratégias alternativas de vida, que resistem à fragmentação trazida pelo
capitalismo contemporâneo - dá coerência à narrativa do Self.
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